Trata-se de uma parceria da cientista Célia Machado Ronconi, professora associada do Departamento de Química Inorgânica da Universidade Federal Fluminense (UFF) e coordenadora do Laboratório de Química Supramolecular e Nanotecnologia, e pesquisadores do Departamento de Química Orgânica da UFF, do Laboratório de Carcinogênese Molecular do Inca (Instituto Nacional de Câncer), coordenado pelo professor Luís Felipe R. Pinto, e do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas. Ela explica: “podemos comparar esse minúsculo reservatório a uma válvula, que se abre e se fecha. Dentro dele fica o fármaco, ou seja, o medicamento anticâncer, que é sempre muito tóxico e acaba afetando não somente as células cancerosas, mas também as saudáveis. O que conseguimos in vitro, no laboratório, foi fazer com que essa válvula , que tem uma espécie de tampa , só se abra quando encontra as células do câncer”. E por que houve essa sincronia tão auspiciosa? Acontece que as células do câncer se desenvolvem num pH mais ácido que o do sangue, e a “tampa” foi projetada para liberar o conteúdo do nanorreservatório exatamente num meio ácido. Por isso a droga foi direto no alvo!
Para quem quer refrescar a memória das aulas de química e biologia, o pH do sangue fica entre 7,35 e 7,45, ligeiramente alcalino. Já o pH de células de câncer é mais ácido e pode variar de 4,5 a 5,5. A “tampa” do reservatório, cujo nome científico é pilarareno, só abre – ou se rompe – para liberar a droga quando o meio está ácido (pH menor que 7), na presença de prótons. Em meio básico (pH maior que 7), o dispositivo permanece fechado. “Investigamos a liberação do fármaco no núcleo de células de câncer de mama e o resultado foi além das nossas expectativas. Houve redução de 92% da viabilidade das células de câncer. O nanorreservatório carregado, que liberou o medicamento, foi mais tóxico para as células de câncer do que o fármaco puro”, afirmou a professora.
O grupo da UFF trabalha com o desenvolvimento de dispositivos que respondam a um comando para liberar fármacos, que pode se dar através de luz, campo magnético, reações de oxirredução ou variação de pH – como ocorreu nesse caso. Seu objetivo é diminuir os efeitos tóxicos dos medicamentos que já existem, melhorando a qualidade de vida dos pacientes. A pesquisa levou aproximadamente dois anos e foi parte do trabalho de doutorado de Evelyn C. S. Santos, com a participação do doutor Thiago Custódio dos Santos, Tamires S. Fernandes e Vinicius G. Madriaga, alunos da UFF. O estudo recebeu investimentos da Faperj (Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Depois de alcançar resultado tão favorável in vitro, os cientistas pretendem agora utilizar camundongos imunodeficientes para os ensaios.