Um equipamento recentemente desenvolvido por pesquisadores da UFV proporciona maior segurança a profissionais de saúde durante uma das mais arriscadas situações de atendimento a pessoas acometidas pela Covid-19: a intubação orotraqueal. O “dispositivo de proteção acrílica para uso durante o gerenciamento de vias aéreas em pacientes com coronavírus” amplia a quantidade e a qualidade de barreiras que isolam os profissionais de secreções e gotículas liberadas durante o procedimento.
São pelo menos três os diferenciais que a caixa de acrílico criada pela Comissão de Produção de Inovações Tecnológicas para o combate ao Covid-19 apresenta em relação a outros modelos que vêm sendo utilizados em hospitais brasileiros desde o começo da pandemia. O primeiro deles é que permite acesso a três profissionais simultaneamente, já que dispõe de seis orifícios para introdução dos braços e manuseio dos equipamentos de intubação – enquanto as demais dispõem de no máximo quatro. Além disso, oferece um dispositivo para vedação composto por uma válvula – modelada e, posteriormente, materializada numa impressora 3D na Universidade – e uma manga-íris. Utilizados juntos, os dois itens também propiciam um ajuste ergonômico e flexível para quem estiver lidando com o paciente.
A terceira novidade é o emprego de uma luva descartável de látex de cano longo acoplada ao dispositivo, fornecendo aos profissionais um recurso protetor adicional. “Minimizar a dispersão de aerossol no decorrer da intubação orotraqueal é fundamental para reduzirmos a probabilidade de contaminação da equipe de saúde, que nessas circunstâncias, mesmo com todos os equipamentos de proteção que já utiliza, fica mais exposta ao contato com o vírus”, explica a professora do Departamento de Medicina e Enfermagem (DEM) da UFV, Flávia Diaz. Ela é integrante da Comissão, composta por pesquisadores, professores e estudantes de graduação e pós-graduação em áreas diversas do conhecimento, como, além de medicina e enfermagem, arquitetura e engenharia. “A redundância na segurança, proporcionada pelas camadas que funcionam como obstáculo físico, é adotada sem comprometer a capacidade de ação no procedimento”, observa o professor do Departamento de Engenharia Elétrica (DEL) Alexandre Santos Brandão.
Desde as primeiras reuniões da Comissão, buscando a elaboração de soluções viáveis para o combate ao novo coronavírus, até a finalização da caixa, levou aproximadamente um mês para que o primeiro exemplar estivesse apto a ser utilizado – que encontra-se, no momento, disponível para uso no Hospital São Sebastião, em Viçosa. “No decorrer do processo de desenvolvimento, realizamos testes que nos permitiram concluir que não houve comprometimento no tempo necessário para o procedimento, na qualidade da intubação e nem o uso de equipamentos de proteção individual (EPI) pelos profissionais”, detalha a professora do DEM Andréia Guerra Siman. Segundo a pesquisadora, o também professor do DEM e anestesiologista Leonardo Fenyves Ferreira, igualmente membro da equipe, testou o dispositivo in loco, no ambiente hospitalar.
No percurso, o projeto passou por fases como a criação de um protótipo em papelão, a modelagem computacional dos itens e a impressão 3D da válvula. De acordo com o mestrando do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo na UFV André Costa, as placas de acrílico são cortadas a laser, sendo possível produzir uma cápsula por hora, enquanto que as válvulas são impressas durante dez horas. “Durante a graduação, eu havia feito iniciação científica nessa área de prototipagem, o que me ajudou bastante agora”, comenta o arquiteto.
Quem também aproveitou conhecimentos obtidos em outras experiências acadêmicas para contribuir com a iniciativa foi o estudante de graduação em Engenharia Elétrica Celso Barcelos. Tendo participado de projetos como o do futebol jogado por robôs, ficou responsável pelo desenvolvimento da válvula – tendo, para tanto, uma motivação extra, decorrente de um episódio em que se acidentou. “Há cinco anos, depois de um acidente com motocicleta, passei por procedimentos cirúrgicos e tive que ficar 15 dias internado. No hospital de Ponte Nova, fui muito bem tratado e recebi o carinho de todos, pelo que sou muito grato. Agora, espero conseguir contribuir para que esses profissionais da área de saúde possam se proteger”, comenta.
Já foram montadas sete caixas, com custo em torno de R$ 700 cada. A Comissão, que vai entrar com pedido de patente para o invento, também tem atuado em outras frentes, a exemplo da criação de EPIs como o faceshield – “escudo facial”, em tradução literal, estrutura protetora para a região do rosto, e máscaras cirúrgicas.