COVID-19: universidades criam testes rápidos a custo de R$ 5

Duas universidades federais, a do Rio de Janeiro (UFRJ) e a do Paraná (UFPR), criaram testes rápidos para detecção de COVID-19 que custam, em média, R$ 5. O valor chega a ser 96% menor dos que atualmente são aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e comercializados no mercado.
Mas, ambos, esbarram em uma questão externa para chegar às farmácias e clínicas. As duas universidades já patentearam seus experimentos, mas dependem de parceiros para a validação junto à Anvisa.
Na UFRJ, o teste foi desenvolvido pelos Institutos Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe) e de Biofísica Carlos Chagas Filho (IBCCF). Chamado de S-UFRJ, o teste, criado sob a coordenação dos cientistas Leda Castilho (Coppe) e André Vale (IBCCF), tem tecnologia escalonável e custo reduzido de produção da proteína S (spike), presente na estrutura do novo coronavírus. O baixo custo da proteína desenvolvida no Laboratório de Engenharia de Cultivos Celulares (Lecc/Coppe), associado a uma coleta de amostras mais simples e acessível, possibilita o acesso e a expansão da testagem – fatores importantes, principalmente em países em desenvolvimento.
Segundo Leda, a produção de testes confiáveis e de baixo custo no país permitirá ampliar significativamente a testagem da população brasileira, que hoje é muito baixa.
“Os testes que detectam anticorpos do tipo IgG mostram se a pessoa já teve contato com o vírus ou não, e são muito importantes para compreender a disseminação da doença. Também podem subsidiar modelos epidemiológicos, auxiliar no desenvolvimento de vacinas, assim como permitir que decisões de políticas públicas sejam cientificamente embasadas”, explica.
O S-UFRJ é uma variação do teste Elisa (sigla em inglês para ensaios de imunoabsorção enzimática). Segundo André, do Laboratório Intermediário de Biologia de Linfócitos (LIBL/IBCCF), o S-UFRJ simplifica o procedimento de coleta, que pode ser feito com um simples furo no dedo do paciente e o depósito de uma gota de sangue em uma tirinha com papel filtro padronizada pelo LIBL.
“A coleta é barata e simples de realizar. Pode ser enviada até pelos correios e ainda permite a fácil composição de um banco de amostras”, afirma.
De acordo com os autores do estudo, muitos dos testes rápidos aprovados pela Anvisa têm desempenho questionável. Uma marca comercializada no Brasil foi comparada com o teste S-UFRJ e apresentou acertos que variaram de 0% para pessoas infectadas com até quatro dias, desde o início dos sintomas, até 71% de acerto para os infectados cujos sintomas começaram há 20 dias ou mais.
Já o S-UFRJ apresenta 40% de acerto nos primeiros quatro dias de sintomas. Em dez dias, ele já ultrapassa 90% e, finalmente, atinge 100% de acerto quando é feito a partir de 20 ou mais dias do surgimento dos sintomas.
O teste criado pelos cientistas da UFPR também é uma adaptação do método Elisa tradicional. A diferença é que em vez de o processo ocorrer na superfície de uma placa de plástico, ele acontece em nanopartículas magnéticas revestidas com antígenos virais. A técnica permite a redução no tempo de reação (interação entre antígeno e anticorpo) proporcionando um procedimento mais rápido. Enquanto o Elisa tradicional leva cerca de três horas para apresentar o resultado, o novo método precisa de apenas 12 minutos e pode ser adaptado para testar até 96 amostras simultâneas, com o auxílio de sistemas robotizados disponíveis comercialmente, mantendo esse tempo para o resultado.
Para a realização do teste, é necessário um volume muito baixo de sangue, que pode ser coletado com uma lanceta igual à utilizada para o exame de glicose. São necessários apenas dois microlitros de fração solúvel, conhecida como soro, também sendo possível utilizar o sangue bruto do paciente.
Essa amostra é incubada com os antígenos virais que estão mobilizados na superfície de nanopartículas magnéticas. Após cerca de dois minutos nessa fase, são feitas etapas de lavagens e, em seguida, acrescenta-se um revelador, que é o responsável por alterar a cor do material caso haja reação positiva. Assim, se o paciente tiver desenvolvido anticorpos contra o coronavírus, a amostra apresentará uma coloração indicando o resultado positivo.
Geralmente, os anticorpos contra o novo coronavírus (SARS-CoV-2) atingem uma estabilização entre 11 a 16 dias após o início dos sintomas. No entanto, alguns pacientes produzem anticorpos detectáveis já entre dois a quatro dias após os primeiros sinais da doença. Por isso, esses testes imunológicos podem ser úteis como ferramentas adicionais para identificar pacientes na fase aguda da Covid-19 ou os que testaram como falso negativo no exame PCR.
“A grande vantagem em relação ao teste rápido tradicional de imunocromatografia é que o resultado da cor no teste da UFPR é diretamente proporcional à quantidade de anticorpos. Ou seja, o ensaio fornece dados da quantidade de anticorpos e não apenas da presença ou ausência, como é o caso do teste rápido tradicional”, revela Huergo.
Para comprovar a eficiência do novo teste, os pesquisadores coletaram amostras de pacientes do Complexo Hospital de Clínicas (CHC) da UFPR que tiveram a Covid-19 confirmada por PCR. As amostras negativas foram obtidas no banco de doadores do hospital a partir do sangue coletado de indivíduos saudáveis em 2018.
O material colhido passou tanto pelo teste Elisa tradicional quanto pelo método criado na UFPR. De acordo com Huergo, no Elisa regular os testes dos pacientes positivos para Covid-19 mostraram forte reação com os antígenos, enquanto os negativos apresentaram uma pequena reação cruzada. Já na tecnologia baseada em nanopartículas magnéticas, os soros positivos mostraram forte reação com os antígenos e os negativos não apresentaram reação cruzada detectável.
“O nosso teste teve um desempenho melhor do que o Elisa clássico, especialmente para amostras com baixo título de anticorpos. O método classificou corretamente 49 das 50 amostras positivas de Covid-19 testadas e mostrou que não houve falsos positivos nas mais de 140 amostras negativas analisadas”, conta o professor. Apesar de uma maior precisão ser obtida com o uso de um leitor de microplaca, os resultados positivos e negativos podem ser observados por inspeção visual, sem a necessidade de instrumentação.
Para a equipe de cientistas, o teste criado por eles tem muitas vantagens com relação ao teste imunológico padrão ouro utilizado atualmente. A primeira delas está associada à quantidade de material necessário para a análise: apenas de uma gota contendo dois microlitros de soro. É possível, ainda, utilizar o sangue total, ou seja, sem precisar passar pela etapa de separação da parte solúvel do sangue.
As reações podem ser interpretadas por inspeção visual, o que facilita a análise em pontos de atendimento, não sendo necessário levar para laboratório nem instrumentação específica. O tempo total de reação é 15 vezes menor que o do teste clássico, resultando em um exame muito mais rápido, que leva 12 minutos no total e pode processar centenas de amostras em poucas horas.
Fonte: https://www.em.com.br/app/noticia/nacional/2020/09/01/interna_nacional,1181462/covid-19-universidades-criam-testes-rapidos-a-custo-de-r-5.shtml