Por Danilo Giroldo
O censo da educação superior, recentemente divulgado pelo INEP, reúne um conjunto robusto de estatísticas educacionais até o ano 2021. Se há uma síntese possível para as informações apresentadas, é que os dados são muito preocupantes, especialmente para um país que tem a intenção de reduzir desigualdades e ampliar o nível de escolaridade da população como pilar para se desenvolver de forma sustentável, social e economicamente. Como agravante, o Plano Nacional de Educação (PNE) se aproxima do final da sua vigência ainda distante das metas planejadas e estabelecidas pela Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014.
Não se pretende aqui detalhar os dados ou analisar profundamente as dimensões do censo, mas apresentar um ponto de vista sobre o panorama da educação superior no Brasil a partir das informações divulgadas, apontando fragilidades evidentes e caminhos possíveis para retomar o importante pacto firmado pela sociedade brasileira por meio do PNE, largamente ignorado nos últimos quatro anos como demonstram os dados apresentados.
O primeiro aspecto do censo a ser ressaltado é justamente as conclusões sobre o lento avanço das taxas de matrícula previstas no PNE que, em sua meta 12, estabelece “Elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% e a taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos, assegurando a qualidade da oferta e expansão para, pelo menos, 40% das novas matrículas, no segmento público”.
Em 2021, havia apenas 39,3% da população de 18 a 24 anos matriculada no ensino superior, taxa que cresceu apenas 3,3% entre 2016 e 2021, contra um crescimento de 5,8% entre 2012 e 2016. Restando apenas dois anos de vigência do PNE, é difícil imaginar que a taxa bruta de matrículas no ensino superior para essa faixa etária alcançará os 50% planejados em 2014. Da mesma forma, a taxa líquida encontra-se distante dos 33% idealizados quando da aprovação do PNE, pois, em 2021, o censo apurou apenas 19,7% neste indicador, mostrando ainda um decréscimo de 0,3% em relação a 2016, contra um crescimento de 3,7% de 2012 a 2016.
A taxa líquida de matrículas difere da bruta ao considerar apenas a população de 18 a 24 anos matriculada no ensino superior, em relação à população total do Brasil nesta faixa etária. Já a taxa bruta considera toda a população matriculada no ensino superior, independentemente de sua idade, em relação à população total do Brasil de 18 a 24 anos. Ambos os indicadores dependerão de políticas públicas efetivas para que as metas do PNE sejam alcançadas no menor tempo possível.
O que torna o desenvolvimento dessas políticas de expansão mais desafiador é o contexto de redução no número de ingressantes e a crescente evasão no ensino superior, fenômenos complexos e multifatoriais que devem ser enfrentados. Os dados apresentados permitem inferir que estas tendências não estão relacionadas com um baixo estoque de demanda nem com aspectos demográficos, o que abre espaço para o aprimoramento significativo de políticas públicas, visando ampliar o acesso e a permanência de estudantes na educação superior.
A influência dos processos de evasão e de baixo ingresso evidenciados no censo demonstra uma preocupante ociosidade no sistema, em um país que ainda não tem 20% dos jovens de 18 a 24 anos no ensino superior e que tem cerca de 42% desta população com o ensino médio concluído sem acessar a universidade. Portanto, o primeiro desafio que se impõe é ampliar o acesso à universidade, flexibilizando e diversificando modalidades de ingresso. Paralelamente, é preciso compreender o fenômeno da evasão em sua complexidade, agindo sobre os elementos mais fundamentais que estão afastando os estudantes do ensino superior, pois essa perda não é da universidade e sim da sociedade brasileira.
Se parece paradoxal enfrentar a evasão e, ao mesmo tempo, ampliar o acesso à universidade flexibilizando modalidades de ingresso, os estudos mais recentes vêm demonstrando que a forma de acesso tem pouca influência no aumento da evasão, ao passo que a assistência estudantil e o envolvimento com projetos de extensão e pesquisa são elementos fundamentais para enfrentá-la. Não basta, portanto, ampliar com urgência o acesso e radicalizar as ações afirmativas, mas será também fundamental incrementar os benefícios de assistência estudantil, bolsas de iniciação científica e pós-graduação, assim como incentivar o fomento para novos projetos nas áreas de ensino, cultura, pesquisa, inovação e, especialmente, extensão no âmbito de sua curricularização.
Um país que tem a educação como base para o desenvolvimento precisa compreendê-la como um processo integral, da creche à pós-graduação, e plenamente articulado com ciência, tecnologia, inovação e compromisso socioambiental. Sem financiamento adequado, autonomia universitária e um desenho estratégico e assertivo de políticas públicas para promover o acesso e a permanência estudantil na universidade, muito dificilmente o Brasil conseguirá enfrentar as históricas injustiças sociais e se desenvolver de forma plena e equitativa.