UFMT descobre novo fungo no Pantanal

O Laboratório de Biotecnologia e Ecologia Microbiana (Labem) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) anunciou a descoberta de uma nova espécie de fungo, com alta resistência a mercúrio e, portanto, grande potencial para uso em remediação de solos contaminados por garimpos “artesanais”. Em homenagem ao pantanal, a pesquisadora responsável pela novidade deu ao fungo o nome de Pseudomonodictys pantanalensis.

Jaqueline Senabio, doutoranda do Programa de Pós-Gradução em Rede em Biotecnologia e Biodiversidade (PPGBB), desenvolvia um estudo sobre os mecanismos que os fungos utilizam para resistir ao mercúrio e remediar o solo contaminado com este, quando se deparou com a nova espécie.

Para sua pesquisa, ela utilizou um grupo de fungos do Banco de Microrganismos do Labem, coordenado pelo professor Marcos Antônio Soares, que também é seu orientador.

“O banco é uma caixa com vários tubinhos plásticos, cada um com um microorganismo vivo e preservado em congelamento. Eles ficam vivos em congelamento, quando você precisa você vai lá no banco, tira do tubinho, coloca em uma condição apropriada, numa cultura rica em nutrientes, ele vai e cresce e daí você trabalha com esse microorganismo”, explicou.

O grupo que a pesquisadora escolheu é composto por fungos chamados de “endofíticos”, que crescem dentro do corpo das plantas em uma relação mutualística, isto é, em que tanto a planta quanto o fungo são beneficiados pela união. “O fungo tem a vantagem porque vive dentro de uma fábrica de açúcar que é a planta, e a planta ganha um hóspede que ajuda ela a combater agentes tóxicos do ambiente, como o mercúrio”.

Entretanto, dentro dos tubos de ensaio escolhidos havia um fungo cuja identificação não parecia corresponder a nenhuma outra espécie conhecida, o que gerou um desdobramento da sua pesquisa.

Fungi

Fungos são seres vivos diferentes de animais e plantas, com os quais estamos acostumados. Como as plantas, eles têm “parede celular”, aquela camada de proteção das células que é mais estruturada que as “membranas celulares” dos animais.

Por outro lado, diferente das plantas – e mais parecido com os animais – os fungos não fazem fotossíntese para se alimentar; e sua parede celular é construída com um açúcar presente também em animais.

Essas semelhanças/diferenças tornavam sua classificação como planta ou animal impossível e, portanto, era necessário classificá-los em um novo reino, só para eles, o reino Fungi. Nem planta, nem animal (nem protozoário e nem bactéria): Fungos são fungos.

Além disso, as células do fungo não apresentam “organizações” como as de plantas e animais e, portanto, eles não têm “tecidos verdadeiros”.

Nosso corpo humano, por exemplo, têm células especializadas em transmitir impulsos elétricos, como as que formam os nervos; têm outras especializadas em produzir insulina, como as do pâncreas; e ainda outras que conseguem produzir pelos. Quando muitas células especializadas trabalham juntas, temos um “tecido”. O fungo é diferente. Tudo que uma célula faz a outra também faz, ou pode fazer.

Isso gera várias implicações em como um fungo se comporta e tudo mais, mas a mais importante delas para entendermos a pesquisa da Jaqueline é que essas espécies raramente apresentam uma “forma” identificável a olho nu, tipo com yorkshires e shih-tzus, que têm tamanhos e pelos de cores evidentemente diferentes, então a pesquisadora precisou utilizar um microscópio para a observação das células e verificar seu crescimento em diferentes meios de cultura.

“Não observamos a reprodução sexuada do fungo em condições laboratoriais. Essa espécie diferencia esporos assexuados chamados de conídios com produção de pigmento alaranjado. Além disso, esse fungo diferencia células de resistência (clamidósporos) de coloração marrom. O micélio atinge aproximadamente 40 mm após 7 dias de crescimento. As hifas são de coloração marrom clara a escura e com septos”.

Além das diferenças morfológicas, a pesquisadora investigou o material genético da espécie e verificou que ela também tinha marcadores genéticos (grupos de genes) diferentes das espécies já conhecidas.

“Esse fungo também tem a capacidade de aguentar concentrações altíssimas de mercúrio, mesmo comparado com outros fungos endofíticos”, complementa o professor Marcos. Entretanto, a forma como este (e outros fungos endofíticos) fazem isso ainda está sendo pesquisada.

Mas os cientistas do Labem trabalham com três possibilidades:

“Uma é a transformação química do mercúrio que está no solo em uma versão gasosa, que volatiliza e sai do solo para a atmosfera. Como nossa atmosfera é massiva, a concentração de mercúrio nela não é o suficiente para contaminar as pessoas”.

“Outra forma é o corpo do fungo dentro da planta aprisionar o mercúrio dentro de sua própria célula. Isso impede que essas partículas continuem afetando o ambiente ao seu redor, ou que sejam transportadas para os rios e lençóis freáticos durante uma chuva”.

E, por último, o fungo também pode prender o mercúrio no corpo da própria planta.

Em sua curiosidade para descobrir a resposta dessa questão, a Jaqueline Senabio se deparou com uma nova espécie por acidente (como tantas outras descobertas da ciência). Ela dedicou-se para investigar isso também, mas não deixou o restante da pesquisa de lado.

A nova espécie já foi divulgada no “Brazilian Journal of Microbiology” e, agora, a pesquisadora trabalha para concluir a sua tese e divulgar também as novidades sobre os mecanismos que fazem destes tipos de fungo aliados importantes na biorremediação de mercúrio.

Mais informações no site e nas redes sociais do Labem.