Ufra pesquisa bioprodutos e bioenergia a partir do caroço do Açaí

Quando o assunto é açaí, há várias formas de consumo e gostos. Para quem é fã de carteirinha da fruta, o importante é que ele não falte à mesa. Mas tanto açaí também gera um tanto de resíduo, principalmente depois que é extraída a polpa. E se esse resíduo pudesse se transformar em papel? Ou em energia?

Esse é um dos trabalhos apresentados pela Universidade Federal Rural da Amazônia dentro da programação do “Diálogos Amazônicos”, evento que ocorre de 04 a 06 de agosto, em Belém, no Pará. O estudo e outras pesquisas da universidade serão apresentados no dia 06 de agosto, das 16h às 18h no auditório da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). As pesquisas estão inseridas no evento “Desafios para o desenvolvimento das Amazônias: debates sobre o clima, bioeconomia e modelos produtivos sustentáveis”, proposto pela Ufra

Sobre a pesquisa:

Estudos realizados pela Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) destacaram que em Belém, no período da safra os batedores processam de 15 a 20 latas do fruto por dia, e na entressafra de 10 a 12 latas. “Desse total processado, cerca de 80% é o caroço, ou seja, é resíduo”, explica a professora Lina Bufalino, doutora em tecnologia da madeira.

O caroço do açaí é um poluente em toda a região Amazônica, tanto na área extrativista, quanto na área urbana. Para buscar uma solução ao problema, a professora lidera uma pesquisa que busca dar um aproveitamento ao caroço. “A cadeia produtiva do açaí tem o potencial de ser toda sustentável. Mas ela esbarra justamente no caroço, esse é o ponto fraco”, diz a professora.

Para a criação do bioproduto, o primeiro passo é a extração da fibra, aquele “cabelinho” que reveste o caroço. Um dos objetivos é produzir uma embalagem sustentável (que fica parecida com um papel manteiga) feita com essa fibra e que possa substituir o plástico. “O nanopaper feito com fibra do caroço de açaí é 30 vezes mais resistente que um papel normal, além de ter transparência e alta barreira para a umidade”, diz. O processo de transformação da fibra em papel filme envolve quatro etapas, que vão desde a retirada da fibra, pré-tratamento químico para isolar a celulose, produção da nanocelulose e produção do papel filme. Parte do processo é realizado em parceria com a Universidade Federal de Lavras (UFLA).

A professora explica que ao redor do mundo os usos de nanopaper de fibras de madeira são utilizados para chips eletrônicos (sem o uso de metais pesados), com aplicação inclusive na área médica. “Conseguindo produzir um nanopaper de qualidade, é possível expandir os usos nanopaper do açaí para uma diversidade enorme de produtos”, explica a pesquisadora. Além dos nanopapers 100% de açaí, é possível combinar as nanofibras do resíduo do açaí com a quitosana, que pode ser obtida dos resíduos de camarão que são muito comuns Amazônia, originando uma outra categoria de filme com potencial para produção de embalagens sustentáveis.

Papel com copaíba?

No estudo, a pesquisadora também espera melhorar o branqueamento da fibra e a qualidade do nanopaper, iniciando a produção de papel reciclado reforçado com a fibra de açaí, com melhor qualidade para utilização e produção em escala semi industrial. Mas não para por aí. A meta é tornar o produto com a cara ainda mais amazônica: misturando ao nanopaper óleos como a andiroba e a copaíba.

“Ficando um papel e um nanopaper melhor a ideia é misturar ele com esses químicos, com isso ele fica mais resistente a bactérias e fungos. Um papel com essa característica pode ser usado como embalagem para proteger alimentos por mais tempo, como protetor de cosméticos e com uma série de funcionabilidades que podem ser desenvolvidas por pesquisadores de diferentes áreas e conhecimentos”, diz.

Bioenergia

Mas tirando somente as fibras para a produção de papel, ainda sobra o caroço. Por isso uma das fases da pesquisa analisou as características e os potenciais do caroço como biomassa para a produção de bioenergia. Biomassa é a matéria orgânica de origem vegetal ou animal, utilizada para produzir energia. Nesse caso, a biomassa é o caroço. A pesquisadora explica que esse resíduo tem alta densidade, o que ajuda no melhor rendimento energético.

Uma das alternativas seria o recolhimento desse resíduo por estabelecimentos comerciais que utilizam fornos a lenha, como fábricas de tijolos e telhas, pequenas indústrias que usam fornos para aquecimento de caldeiras, restaurantes e pizzarias. O processo de queima controlada da biomassa não libera gases poluentes, mas sim o chamado carbono neutro.

“A biomassa do caroço do açaí não concorre com a alimentação, ou seja, ao invés de você plantar biomassa pra fazer energia, você já tem esse resíduo disponível, com ampla disponibilidade, situação que é comum em toda a Amazônia”, explica a professora.

Na queima do resíduo do açaí, entretanto, é gerado cinzas com resíduo. Para isso, a pesquisadora desenvolveu uma outra solução, giz de cera 100% sustentáveis.

Em 2020, dados do Panorama Agrícola do Pará, produzido pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agropecuária e da Pesca (Sedap) colocaram o estado como o principal produtor brasileiro do açaí e o responsável por 94,03% da produção nacional. O documento utilizou informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE), que destacou o município de Igarapé Miri como o principal produtor no estado, seguido dos municípios de Cametá e Abaetetuba.

Confira os outros projetos que serão apresentados pela Ufra no dia 06 de agosto:

Dia 06/08

16h – Boas-vindas pela Reitora Profa. Herdjania Veras de Lima

16:05h – Coordenador da proposta: Prof. Fabricio Noura, proposta da UFRA aprovada pelo gabinete da presidência da República.

16h10 – Tema 1:Aprimoramento do ICMS Verde enquanto estratégia de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal – REDD+ Profa. Dra. Ynis Ferreira (7 min)

16h27 – Tema 2. Biosocioeconomia: Política de bioinsumos. Mercado e cadeias produtivas

Case 1. Cadeias Produtivas, Mercado e Desenvolvimento Sustentável. Prof. Dr. Antônio Cordeiro e Prof. Marcos Antônio Souza dos Santos

Case 2. Biodiversidade e a Política de Bioinsumos: Bioinsumos microbianos para o manejo fitossanitário: Profa. Telma Batista/Profa. Gisele Barata

Case 3. Bioprodutos e bioenergia a partir do resíduo do açaí: Profa.Lina Bufalino

Case 4. Biochar do caroço do açaí para acondicionamento de solos contaminados Prof. Antonio Fernandes

17h20 – Tema 3. Tecnologias emergentes, IA e omicas Prof. Gilberto Nerino de Souza Junior 17h27 – Tema 4. Enactus: Prof. Natalia Guarino

17h:35 – Tema 4. ESG (Environmental, social, and governance) Prof. Dr. Fabrício Noura e Profa. Dra. Yana Fadul

17h50 – Leitura do documento com 2 laudas para envio do relatório à Cúpula da Amazônia.

Os diálogos prévios, plenárias e propostas vão auxiliar na elaboração de relatórios, que serão encaminhados diretamente aos oito chefes de estado presentes na capital paraense durante a Cúpula da Amazônia, evento realizado nos dias 08 e 09 de agosto, no Hangar Centro de Convenções da Amazônia.

Por Vanessa Monteiro

Texto originalmente publicado em UFRA