Por que investir em ciência e tecnologia? – Por Allan Rodrigues

Sempre que governos elaboram seus orçamentos ressurge um velho debate: diante de um orçamento apertado e tantas prioridades, vale a pena destinar recursos para ciência e a tecnologia? Na maioria das vezes, grande parte da população/eleitores ou fica à margem das discussões ou participa de forma pouco esclarecida. A questão volta agora à pauta nacional com o envio para o Congresso Nacional pelo Governo Federal do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2024.

O documento desagradou a comunidade científica por destinar apenas 50% do total de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) para os chamados recursos não reembolsáveis. O motivo da insatisfação é justificado para o cenário brasileiro, pois são esses recursos que financiam os laboratórios de universidades e de institutos de pesquisa públicos ou sem fins lucrativos. São justamente estas instituições as principais responsáveis pela produção científica nacional e as mais carentes de recursos.

As entidades científicas do país pleiteavam desde o início do ano um percentual maior e o próprio Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) defendia que 60% do FNDCT fosse usado em recursos não reembolsáveis. No entanto, para surpresa dos pesquisadores, somente a metade do fundo foi destinada ao financiamento de projetos que visam o desenvolvimento tecnológico e a produção de conhecimento científico no Brasil. A outra, composta pelos recursos reembolsáveis, funciona como empréstimos destinados a projetos de desenvolvimento tecnológico de empresas privadas.

Criado em 1969, O FNDCT funciona como um braço financeiro de uma política de Estado que associa o crescimento do país a sua capacidade de formar pesquisadores e montar uma infraestrutura científica e tecnológica competitiva. A lista de projetos de pesquisa que o FNDCT patrocinou é extensa. O fundo foi crucial para montar laboratórios em universidades e criar as bases do sistema de pós-graduação do Brasil.

No primeiro semestre deste ano, o presidente Lula abriu um crédito suplementar de R$ 4,18 bilhões ao orçamento do FNDCT, que passou a dispor de R$ 9,96 bilhões para 2023. Além disso, reinstalou o Conselho de Ciência e Tecnologia (CCT), entregou a Ordem Nacional do Mérito Científico e lançou a 5a Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia, a ser realizada no primeiro semestre de 2024. Durante o evento de reinstalação do CCT, Lula afirmou: “A ciência voltou!”.

A frase do presidente fez referência aos últimos quatro anos, quando o FNDCT foi esquecido por um governo que escreveu uma página tenebrosa na história do país. Vivemos um período em que o negacionismo, a intolerância e as ações sistemáticas destinadas a causar um colapso do sistema de financiamento público da ciência, tecnologia, inovação e educação viraram políticas federais. Em razão desses fatos, a frase de Lula e os recursos que já liberou e que pretende liberar por meio da PLOA para ciência e tecnologia são insuficientes.

Em decorrência do “apagão científico” provocado pelo governo passado, o desafio de promover o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil, que já era grande, tornou-se ainda maior e o tempo a ser recuperado também. Logo, é fundamental não somente recompor, mas ampliar os recursos do FNDCT para que a ciência brasileira ganhe escala e disponha de grandes laboratórios capazes de viabilizar pesquisas em áreas que permitam, por exemplo, o desenvolvimento sustentável e inclusivo da Amazônia.

Retomando a pergunta do título deste artigo, a resposta é sim! Nenhum país desenvolvido atingiu este status sem investir em ciência e tecnologia. Conquistas como energia limpa e barata, alimentos saudáveis com preços acessíveis, aumento da oferta de empregos, meio ambiente equilibrado, tratamentos médicos avançados, vacinas eficientes, educação de qualidade e aumento da renda das famílias passam pelo investimento massivo e contínuo em ciência e tecnologia. Portanto, a luta por mais recursos para a ciência não é apenas dos cientistas, mas de toda a sociedade brasileira.

Allan Soljenítsin Barreto Rodrigues é jornalista, escritor, professor do Curso de Jornalismo da Ufam, mestre e doutor em Sociedade e Cultura na Amazônia e líder do Grupo de Pesquisa em Comunicação, Cultura e Amazônia (Trokano).