‘Se tem um caminho de transformação da vida é a educação’, diz ministra Macaé Evaristo em Aula Magna na UFSC

Os olhos das mulheres (e de todos os presentes) estavam bem acordados quando a ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, Macaé Evaristo, começou a falar na Aula Magna de início do semestre letivo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), na noite desta terça-feira, 12 de agosto, em Florianópolis. Antes de passar a palavra à ministra, por volta das 20h30, a vice-reitora da UFSC, Joana Célia dos Passos, citou o poema A noite não adormece nos olhos das mulheres, de Conceição Evaristo, que é prima da ministra.

Foi uma forma de convidá-la a debater o tema do 1º Seminário Estadual Mulheres na Gestão das Instituições Públicas de Ensino Superior de Santa Catarina, evento fruto de parceria da UFSC com o Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), o Instituto Federal Catarinense (IFC), a Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) e a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Os parceiros de seminário e a Defensoria Pública de Santa Catarina se reuniram para convidar Macaé Evaristo para falar ao público em Florianópolis.

“Quando ocupamos esses espaços, é preciso ‘escreviver’ a gestão pública”, disse a ministra ao longo de sua fala, lembrando também da prima escritora. Conceição Evaristo definiu a escrevivência – uma forma de escrever que leva em consideração a experiência de vida, especialmente de mulheres negras. Ao todo, a ministra Macaé Evaristo falou por cerca de 40 minutos ao público que lotou o Auditório Garapuvu, do Centro de Cultura e Eventos Reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo, no bairro Trindade. Ela tocou em diferentes assuntos, começando por pedir benção às autoridades religiosas presentes, ressaltando a importância da liberdade de religião em um país laico. “A relação com o sagrado nos completa”, disse.

De início, Macaé Evaristo relatou parte de sua infância em São Gonçalo do Pará, cidade do interior de Minas Gerais. Lá, segundo ela, conheceu incômodos que não sabia definir. Mais tarde soube se tratar de preconceito. A mãe, prudente, fez com que todas as filhas estudassem. “Se tem um caminho de transformação da vida é a educação”, disse a ministra. A leitura mostrou à Macaé Evaristo que há pessoas tratadas de forma diferente. “Nós não nascemos desiguais, nos fazem desiguais”, concluiu.

PIX, soberania nacional e Cancellier

A ministra ressaltou a presença de muitos movimentos sociais na Aula Magna, que lutam por reduzir tais diferenças. Muitos estiveram com Macaé Evaristo em recepção anterior ao evento no Garapuvu. “Estou aqui com o coração muito aquecido”, disse. “A Universidade pode contribuir com essa luta garantindo a pluralidade de ideias e de pensamento, na pesquisa, no ensino e na extensão”, recomendou.

Macaé Evaristo tratou pontualmente de uma diversidade de assuntos em sua fala: da necessidade de regulação das redes sociais; da taxação de bilionários; da isenção do imposto de renda para quem ganha menos; da necessidade de defender escolas públicas e servidores públicos; da crítica a algumas ações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump; da definição de soberania nacional em respeito aos brasileiros; do tratamento dispensado a pessoas em situação de rua; da COP 30, entre outros.

“Quem diria que o PIX, criado por servidores públicos do Banco Central, faria tremer um império?”, questionou a ministra. Em determinado momento, ao lembrar ataques sofridos pela UFSC, Macaé Evaristo discursou sobre o caso do reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo. “Foi uma pessoa assassinada”, descreveu, sendo aplaudida pelos presentes.

Aplausos pontuaram a noite

Os aplausos, aliás, pontuaram a noite antes mesmo da fala da ministra. Quando a mestre da cerimônia, a jornalista Carolina Fernandes, iniciou a apresentação do evento e lembrou que se formou na UFSC, a plateia já bateu palmas. Ela agradeceu dizendo estar feliz de voltar à Universidade. Antes da composição da mesa, a Orkextra UFSC, projeto do Departamento Artístico Cultural (DAC) da Secretaria de Cultura, Arte e Esporte (SeCArtE/UFSC), apresentou duas músicas instrumentais. O público respondeu com mais palmas.

Para compor a mesa do evento, Carolina Fernandes chamou, primeiro, a ministra Macaé Evaristo. Depois, subiram ao palco do Garapuvu: o reitor da UFSC, Irineu Manoel de Souza; a vice-reitora da UFSC, Joana Célia dos Passos; a vice-reitora da UFFS, Sandra Simone Hopner Pierozan; a vice-reitora da Udesc, Clerilei Aparecida Bier; a pró-reitora de Graduação e Educação Básica da UFSC, Dilceane Carraro; a pró-reitora de Ensino do IFC, Liane Vizzotto; a diretora-executiva do IFSC, Ana Paula Kuczmynda da Silveira; e a ouvidora-geral da Defensoria Pública de Santa Catarina, Maria Aparecida Lucca Caovilla.

Dossiê indígena e carta dos estudantes

Com a mesa composta e após a execução do Hino Nacional, a vice-reitora da UFSC fez uso da palavra. “Santa Catarina é um lugar de muita resistência, ministra”, disse se dirigindo à Macaé Evaristo, citando coletivos sociais e sujeitos políticos atuantes no estado. Depois de algumas palavras, a professora Joana quebrou o protocolo. Ela chamou ao palco um grupo de representantes de povos indígenas. Quatro pessoas entregaram um documento à ministra. Era um dossiê relatando violações de direitos e violências cometidas contra indígenas em Santa Catarina.

“A gente pede socorro”, resumiu Nandjá Schirlei Priprá, do povo Laklãnõ-Xokleng, que também representou retomadas de Santa Catarina dos povos Kaigangs e Guaranis. Ela explicou aos presentes que o documento relata questões de território e saúde dos indígenas, além da luta por educação, casa, entre outras questões. “Nós, mulheres, estamos nessa luta”, acrescentou.

Dois representantes do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFSC também subiram ao palco, após terem o pedido atendido pela professora Joana, em uma segunda quebra de protocolo. Maria Eduarda Santos da Silva falou primeiro, explicando que leriam uma carta preparada pelos estudantes. João Victor Primo foi quem leu o documento, que saudava a ministra, mas refletia “preocupação” e “esperança” do DCE em relação a algumas questões. A principal delas dizia respeito à morte de palestinos em ataques de Israel.

A carta dos estudantes pede providências do Governo Brasileiro, incluindo redução de relação com aquele país. A ministra assinou a carta e, mais tarde, em sua fala, lembrou que, em Genebra, já denunciou a quebra de direitos humanos, sem que houvesse corredores humanitários na região do conflito. O público presente ecoou: “Palestina livre já”.

Reitor saúda novos estudantes

Na sequência, o reitor da UFSC, professor Irineu, fez uso da palavra. Ele ressaltou que a Aula Magna é um dos “momentos felizes” da Universidade. O reitor saudou os novos 2,7 mil estudantes que estão iniciando as aulas na UFSC neste semestre. Também parabenizou a vice-reitora pela promoção do seminário. “A UFSC continua abrindo as portas para mais inclusão no Ensino Superior”, disse o reitor. Segundo ele, a gestão da Universidade destinou 50% dos cargos das pró-reitorias ao comando de mulheres.

O professor Irineu também lembrou diferentes políticas públicas da UFSC em prol da igualdade, como aquela que visa dar mais apoio às estudantes mães e a que combate o assédio. O reitor desejou um semestre de realizações, aprendizado e felicidade à comunidade universitária. “As universidades públicas são, sem dúvida, o maior patrimônio do povo brasileiro”, avaliou. E concluiu a fala exaltando: “viva a UFSC”.

Ao fim de todas as falas, por volta das 21h10, e depois da icônica foto do palco com o público ao fundo, as pessoas presentes queriam mais. A ministra, cercada pelos presentes, posou para fotos pessoais o quanto pôde. Parecia que a noite insistia em não adormecer nos olhos de ninguém…
Fonte: UFSC