Diante do uso crescente de substâncias químicas no ambiente, como defensivos agrícolas, é fundamental prever com precisão sua toxicidade para avaliar os riscos ao meio ambiente e proteger organismos não alvo, como abelhas e outros polinizadores. Nesse contexto, a proteção desses organismos, essenciais para a manutenção dos ecossistemas, acaba de ganhar um reforço. Um estudo conduzido pelo grupo de pesquisa Algoritmos Aplicados à Química Medicinal e Inteligência Artificial (ALQUIMIA), da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), apresentou um modelo de inteligência artificial capaz de prever a toxicidade de diferentes moléculas em abelhas. A pesquisa foi publicada recentemente na revista internacional Ecotoxicology.
O artigo “Nova geração de modelagem QSAR para segurança de abelhas: prevendo toxicidade usando redes neurais gráficas e dados de apistox” tem autoria do estudante do curso de Engenharia da Computação Talisson Damião e dos professores Rosalvo Ferreira de Oliveira Neto, do Colegiado de Engenharia da Computação, e Edilson Beserra Alencar Filho, do Colegiado de Farmácia da Univasf, líderes do grupo ALQUIMIA.
Fruto do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Damião, o estudo desenvolveu um modelo baseado em Redes Neurais de Grafos (Graph Neural Networks – GNN), uma técnica de inteligência artificial que analisa as conexões entre os átomos de uma molécula para prever se ela pode representar risco aos polinizadores. Os resultados apontaram que o modelo é capaz de identificar substâncias potencialmente tóxicas de forma eficiente, contribuindo para o avanço das pesquisas em proteção ambiental e segurança das abelhas.
Segundo o professor Edilson Beserra Alencar Filho, colaborador da pesquisa, modelos como este são fundamentais para identificar e prevenir impactos de substâncias químicas sobre polinizadores, ajudando a proteger o meio ambiente e a biodiversidade.
Da esquerda para a direita: o estudante Talisson Damião e os professores Rosalvo Ferreira e Edilson Beserra.
“Esses compostos podem acabar expondo agentes tóxicos para insetos de importância ecológica, como as abelhas, fundamentais no processo de polinização. O modelo de IA do tipo GNN capta informações moleculares imprescindíveis para uma relação estrutura-atividade robusta, diretamente vinculadas às conectividades atômicas, gerando maior confiabilidade e interpretabilidade química”, explica o professor.
O modelo também é capaz de explicar seus próprios resultados, mostrando quais partes das moléculas estão ligadas à toxicidade. Foram identificados padrões químicos, como certos grupos de átomos presentes em pesticidas e outras substâncias, que já são conhecidos por afetarem o sistema nervoso das abelhas. Além disso, alguns componentes das moléculas podem se acumular mais facilmente no organismo, aumentando o risco de efeitos nocivos.
Esses resultados mostram que as redes neurais gráficas são ferramentas promissora para prever os efeitos de substâncias químicas sobre o meio ambiente, combinando precisão, clareza na interpretação e aplicação prática. Segundo o professor Edsilson Beserra, já há outra pesquisa em andamento que pretende desenvolver um aplicativo móvel baseado nesse modelo. “A ideia é que o app permita avaliar rapidamente o potencial tóxico de moléculas para abelhas, a partir do código identificador ou da estrutura química da substância”, adianta.
Para o docente, o trabalho representa o papel social e científico da universidade pública. “A Universidade Pública tem o papel de devolver à sociedade soluções para problemas que a afetam, sob perspectivas interdisciplinares. No contexto do Polo de Fruticultura Irrigada de Petrolina (PE) e Juazeiro (BA), o monitoramento ambiental de substâncias e sua toxicidade em polinizadores é fundamental para o manejo sustentável. Essa pesquisa mostra como a união entre Química Medicinal e Computação moderna pode gerar impacto real e positivo”, destaca Beserra.
ALQUIMIA – O grupo de pesquisa ALQUIMIA foi criado há cerca de um ano na Univasf e é liderado pelos professores Edilson Beserra Alencar Filho e Rosalvo Ferreira de Oliveira Neto. O grupo atua na interface entre Química Teórica e Inteligência Artificial, com foco em problemas relacionados à saúde humana, meio ambiente e agricultura.