Mapear e estudar de forma aprofundada a biodiversidade existente na chamada “Amazônia azul”, quilômetros de mar amazônico ainda pouco conhecidos pela ciência. Esse é o objetivo dos pesquisadores que vão embarcar no “Ciências do Mar II”, um barco laboratório de ensino e pesquisa, que parte nesta sexta-feira (24) de Belém, no Pará e deve percorrer mais de 3 mil km em mar aberto. A coordenação do cruzeiro na região é da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) e vai reunir uma equipe com nove pesquisadores e nove estudantes da Ufra e de outras instituições brasileiras, que juntos vão permanever em torno de dez dias realizando estudos no mar. Microorganismos, microalgas, invertebrados, crustáceos, esponjas, peixes, baleias, golfinhos, aves, tudo isso vai ser observado.
“Existe um saber de alto nível voltado para a Amazônia verde, as florestas, a área continental. Mas a parte costeira, marinha, ainda é pouco conhecida. Nessas pesquisas esperamos encontrar inclusive espécies que ainda não foram descritas pela ciência, espécies novas. O mar amazônico vai do Amapá ao Piauí, são quilômetros de extensão e se conhece de forma muito superficial essa biodiversidade toda. Sabemos, por estudos anteriores, que na Amazônia existe um mar de esponjas único do mundo, um verdadeiro jardim submarino com esponjas de vários metros de altura e ainda pouco conhecidos”, diz o coordenador-chefe do cruzeiro na Amazônia, Eduardo Tavares Paes, doutor em Oceanografia e professor da Ufra. Segundo o pesquisador, esse tipo de projeto também ajuda a preservar o ambiente marinho, especialmenre diante das mudanças climáticas. “Nós já sabemos que em muitas regiões, no arquipélado do Marajó, por exemplo, já existe salinização dos rios, porque o oceano está entrando. Mas quanto isso impacta diretamente na fauna marinha, que consequentemente impacta nas comunidades locais?”, diz.

Embarcação faz parte de uma frota nacional de quatro embarcações idênticas. Pela primeira vez, esses quatro navios realizam os cruzeiros no mesmo período, em todo o país. Agora é a vez da região Norte, mais especificamente, da “Amazônia Azul”. Foto: arquivo do pesquisador
O navio também serve para a formação prática de alunos de graduação e pós-graduação dos cursos de biologia marinha, engenharia de pesca, engenharia ambiental e da pós-graduação em Aquicultura e Recursos Aquáticos Tropicais da Ufra. A embarcação é equipada com laboratórios, guinchos, guindastes e outros equipamentos científicos, para que os estudantes possam aprender seus usos e realizar pesquisas, coletas e análises de amostras do ambiente marinho. “Uma das metas é formar alunos através da experiência embarcada. Por isso pesquisadores mais experientes e alunos que vão aprender a bordo os protocolos, usar equipamentos e ter um treinamento mais avançado nos estudos e planejamento”, diz o coordenador.
O navio Ciências do Mar II faz parte de uma frota nacional de quatro embarcações idênticas, financiados por edital dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), do CNPq e adquirida pelo Ministério da Educação em parceria com a Marinha Brasileira. O objetivo é conhecer de maneira aprofundada e comparável, a biodiversidade marinha do país, do Oiapoque (AP) ao Chuí (RS). Pela primeira vez, esses quatro navios realizam os cruzeiros no mesmo período, em todo o país. Já foram realizados cruzeiros no Sul, Sudeste e Nordeste. E agora é a vez da região Norte, mais especificamente, da “Amazônia Azul”.
“É a primeira vez no Brasil que se faz um ampla prospecção biológica e oceanográfica ao mesmo tempo, com a mesma metodologia, mesmo tipo de coleta de dados, imagens de satélite, medidas de corrente, coletas de agua. É um grande esforço para se conhecer a biodiversidade brasileira. E pela primeira vez também a Ufra entra no cenário nacional das Ciências Marinhas, participando como protagonista, uma conquista que a universidade celebra nesse momento”, diz o pesquisador.

Professor Eduardo Tavares Paes, da Ufra, é o coordenador-chefe do cruzeiro na Amazônia. Ele diz que o ambiente marinho da região ainda é pouco estudado. Foto: arquivo do pesquisador
O materiais biológicos coletados nos embarques serão analisados tanto in loco quanto nos laboratórios da universidade, inclusive com equipamentos que a universidade adquiriu pelo projeto e que vão permanecer na instituição.
Estão previstos mais dois embarques, em 2026, mas a meta é continuar com esse tipo de trabalho. “O conhecimento do mar não se encerra nesse cruzeiro. A ideia é que aos poucos possamos constituir cruzeiros regulares que não dependam mais de recursos de fora da Amazônia, que as nossas universidades consigam captar recursos e ter suas embarcações e centros de pesquisa, esse é só o começo. Daqui há algum tempo quem sabe não temos um Centro de Estudos de Biodiversidade Marinha Amazônica, que ainda não tem nenhum”, diz.
Texto: Vanessa Monteiro, jornalista, Ascom Ufra