Mais mulheres nas ciências exatas – por Márcia Abrahão

De acordo com a ONU Mulheres, 37% das mulheres de todo o mundo não têm acesso à tecnologia. Trata-se de uma realidade dura, que amplia as desigualdades econômicas e sociais, com efeitos dramáticos para as futuras gerações. Chama também a atenção a baixa presença de meninas e mulheres em cursos das chamadas áreas Stem — sigla em inglês para ciência, tecnologia, engenharia e matemática.

Na Universidade de Brasília (UnB), por exemplo, as estudantes em cursos de ciências exatas são minoria. Nas engenharias, representam menos de 25%, e em cursos como estatística e computação são cerca de 26%. No ensino superior brasileiro, as matrículas de mulheres nas graduações Stem são aproximadamente 35%. No mundo, dos 589 Prêmios Nobel nessas áreas, apenas 17 foram concedidos a mulheres.

A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) identificou quatro aspectos que influenciam a participação, a continuidade e o desempenho de meninas e mulheres nas exatas. O primeiro é individual, que envolve as decisões pelos estudos e carreiras fortemente influenciados por estereótipos de gênero. O segundo diz respeito à família, que influencia a partir de seus valores e das experiências que fornecem. O terceiro é social, ligado às normas culturais e sociais, papéis sociais, percepções das meninas e mulheres sobre suas habilidades, entre outros. Por fim, existe a contribuição do ambiente escolar, com diferenças na participação de meninos e meninas em atividades mais relacionadas às exatas desde a educação infantil, algo que se reflete de maneira mais clara no ensino superior.

Os dados por si sós seriam preocupantes. Entretanto, se agravam ao pensarmos nas profissões do futuro, que exigirão cada vez mais conhecimento nas áreas Stem. Até 2050, a metade dos empregos que existem hoje não existirão mais e 75% das vagas vão exigir conhecimentos em ciências, tecnologia e inovação. Assim, é preciso fazer uma mudança robusta em políticas públicas de incentivo à presença de meninas e mulheres nas ciências exatas, bem como na ocupação de cargos de comando e gestão em áreas ligadas à tecnologia.

A empregabilidade das mulheres das gerações futuras depende desse olhar, além, é claro, de uma reflexão profunda de todas e todos — de governos, setor público e privado — sobre o papel crucial do cuidado, que ainda recai majoritariamente sobre as mulheres. Falar sobre acesso universal à creche, licença paternidade e formalização do trabalho, por exemplo, é fundamental para garantir o pleno desenvolvimento profissional, sua autonomia financeira e emocional.

É também importante que sejam desenvolvidas políticas de equidade de gênero no acesso e na utilização da tecnologia. Sabemos que os recursos têm potencial de criar oportunidades para mulheres em diversas áreas, como a educação, o empreendedorismo e a participação política. Mas é preciso que o incentivo seja estruturado, que meninas e mulheres sejam encorajadas a se desenvolver nas áreas Stem, para que possam se inserir no mercado de trabalho, empreender e criar soluções inovadoras para os desafios que enfrentam em suas comunidades. Potencial e capacidade, certamente, não faltam.

Temos procurado trazer esse tema para a UnB. No âmbito de nossa campanha institucional de 2023, intitulada “Futuro é Agora”, lançamos o edital “Mulheres e meninas na ciência: o futuro é agora”. A oportunidade, conceitualmente articulada com a campanha da ONU e com o debate contemporâneo, visa fomentar projetos de extensão que incentivem a participação feminina nas áreas de ciência e tecnologia.

As iniciativas deverão ter atuação voltada, sobretudo, para as escolas públicas do Distrito Federal e, oportunamente, nos polos de extensão de Ceilândia, Estrutural, Paranoá e Recanto das Emas e nas Casas Universitárias de Cultura da UnB. O edital contemplará até 20 projetos e serão concedidas até duas bolsas de extensão por iniciativa selecionada, pelo período de seis meses, com vigência prevista de julho a dezembro de 2023.

Na UnB, convidamos a todos para a construção de uma sociedade mais inclusiva, participativa, digital, multicultural, democrática, sustentável e criativa para as mulheres — dentro e fora dos câmpus. Neste #8M, convido a celebrarmos iniciativas que estão engajadas no avanço das tecnologias e na participação feminina como forma de garantir uma transformação digital que, efetivamente, permita a meninas e mulheres serem o que quiserem.

Márcia Abrahão é reitora da Universidade de Brasília