Duas décadas de inclusão – Por Márcia Abrahão

É com imenso orgulho que celebramos os 20 anos da implementação das cotas raciais na Universidade de Brasília (UnB). Desde a adoção dessa importante política de inclusão, criada na nossa instituição em 6 de junho de 2003, temos testemunhado transformações significativas na comunidade, que se refletem não apenas nos resultados acadêmicos, mas também na construção de uma sociedade mais igualitária e justa.

Sendo pioneira entre as universidades federais a estabelecer cotas, estávamos cientes dos desafios que teríamos pela frente. No entanto, o compromisso de promover a equidade e combater as desigualdades históricas era mais forte. Um dos momentos mais difíceis ocorreu quando a nossa política foi questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). Em abril de 2012, a corte estabeleceu que a iniciativa da UnB era constitucional. No mesmo ano, o governo federal sancionou a Lei nº 12.711, conhecida como Lei de Cotas para o Ensino Superior.

Ao longo das duas décadas, pudemos testemunhar inúmeros casos de sucesso que comprovam a eficácia e a importância das cotas raciais. Estudantes que antes enfrentavam barreiras e obstáculos intransponíveis agora têm a oportunidade de ingressar e se destacar em cursos de graduação, mestrado e doutorado na UnB. Mais do que uma política de acesso, as cotas raciais se tornaram um instrumento de transformação social. Em 2021, 11.547 estudantes entraram nos cursos de graduação da Universidade por meio desse sistema. Em 2020, aprovamos as cotas para os cursos de pós-graduação. Este ano, encaminhamos para discussão na nossa comunidade proposta que busca ampliar o percentual de docentes negras e negros na UnB. Esperamos aprová-la em breve.

Além de garantir representatividade étnico-racial em nossos espaços acadêmicos, as cotas têm contribuído para a diversificação do conhecimento produzido em nossa Universidade. Ao ampliar a pluralidade de vozes e perspectivas, criamos um ambiente mais propício para o diálogo intercultural e a compreensão mútua. Essa diversidade enriquece o ensino, a pesquisa e a extensão, impulsionando a produção de conhecimento crítico e inovador.

No entanto, mesmo com os avanços alcançados, precisamos reconhecer que ainda há muito a ser feito. É fundamental que a UnB e as demais universidades federais tenham condições materiais para que continuem a investir em políticas de inclusão e permanência estudantil, garantindo o suporte necessário para que todos os estudantes, independentemente de sua origem social e identitária, possam prosperar e concluir seus cursos com sucesso.

Além disso, é essencial promover ações afirmativas que vão além do acesso inicial à universidade. Devemos buscar uma transformação profunda em nossas estruturas e práticas acadêmicas, assegurando a igualdade de oportunidades em todos os níveis e segmentos da vida universitária.

Nesse sentido, temos atuado em várias frentes na UnB: a criação da Câmara de Direitos Humanos, da Secretaria de Direitos Humanos e de uma Política de Direitos Humanos; a criação de dois prêmios de direitos humanos, Anísio Teixeira e Mireya Suárez, que reconhecem atividades de ensino, pesquisa e extensão para a promoção de direitos humanos na UnB; o estabelecimento de comissões de heteroidentificação para o ingresso nos cursos de graduação e de pós-graduação; a criação do Comitê Permanente de Acompanhamento das Políticas de Ação Afirmativa; e a ampliação dos programas de assistência estudantil e de auxílios e bolsas acadêmicas.

Ao celebrarmos os 20 anos das cotas raciais na Universidade de Brasília, reafirmamos nosso compromisso com a justiça social e a promoção da igualdade e da equidade. E que o exemplo da UnB continue a se espalhar pelo Brasil, para que tenhamos um país com mais oportunidades de acesso ao conhecimento e constituído por cidadãs e cidadãos empenhados diuturnamente na defesa dos direitos humanos, do desenvolvimento sustentável e da democracia plena.

Márcia Abrahão é reitora da UnB