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A nova Lei de Cotas e o papel pioneiro da UnB – Por Márcia Abrahão Moura

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A Universidade de Brasília (UnB), pioneira entre as universidades federais, iniciou o ingresso por cotas raciais em 2004.

No último dia 13, o Brasil testemunhou um marco significativo com a sanção da Lei nº 5.384, a nova Lei de Cotas, cuja relatoria na Câmara dos Deputados ficou a cargo da deputada federal Dandara Tonantzin (PT/MG), graduada pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e mestra pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O relator no Senado foi o senador Paulo Paim (PT/RS).

Entre as alterações trazidas pela nova lei, estão a inclusão de estudantes quilombolas, a prioridade para cotistas no recebimento de auxílio estudantil, a extensão das políticas afirmativas para a pós-graduação e o teto de renda familiar para um salário mínimo per capita. Uma mudança significativa é o novo processo de ingresso, priorizando a ampla concorrência antes das reservas de vagas por cotas.

A Universidade de Brasília (UnB), pioneira entre as universidades federais, iniciou o ingresso por cotas raciais em 2004. Como ocorre com os pioneiros, a trajetória das cotas raciais na UnB teve seus desafios, notadamente em 2009, quando a política foi questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). Em abril de 2012, após uma longa batalha judicial, o STF reconheceu a constitucionalidade da nossa iniciativa. Em agosto do mesmo ano, a presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei nº 12.711, conhecida como Lei de Cotas para o Ensino Superior. Mesmo assim, a UnB manteve o programa próprio de cotas, destinando 5% das vagas da graduação para estudantes negros e 5% para indígenas. Incorporamos em seguida as pessoas com deficiência e temos ampliado cada vez mais o ingresso de estudantes indígenas.

Em 2007, a UnB ousou mais uma vez: foi uma das quatro universidades que iniciaram o projeto-piloto de licenciatura em educação do campo. Hoje, 33 instituições, todas públicas federais, têm o curso, que representa uma experiência universitária ímpar, chamada de pedagogia da alternância, a quilombolas, assentados, ribeirinhos, gerazeiros e outros residentes do campo.

O compromisso da UnB com a inclusão não se limita à graduação. Em 2020, aprovamos a política de ação afirmativa para negros, indígenas e quilombolas para a pós-graduação. Em 2021, passamos a reservar 31% das vagas de estágios para estudantes negros e indígenas. Este ano, aprovamos política para ampliar ainda mais a quantidade de docentes negros e indígenas. Em breve, a UnB vai inovar novamente: seguindo o perfil demográfico da população brasileira, vamos implementar cotas na graduação para pessoas com 60 anos ou mais.

Seguindo os passos dos mestres Darcy Ribeiro e Anísio Teixeira, como primeira mulher reitora da Universidade de Brasília, desde 2016 faço de uma das minhas missões a busca obstinada pela promoção dos direitos humanos, juntamente com a defesa intransigente da democracia.

A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), que representa todas as 69 universidades federais do país, dois centros federais de educação tecnológica e dois institutos federais de educação ciência e tecnologia, destacou, em sua última pesquisa, um progresso notável no percentual de cotistas nas universidades federais: de 3,1%, em 2005, para 48,3%, em 2018. Além disso, 51,2% dos estudantes da graduação são negros.

Os números, portanto, falam por si. Na última avaliação do Ministério da Educação, quase 90% das universidades federais obtiveram a nota máxima. Na pós-graduação, 80% das instituições com cursos de excelência são universidades federais. As demais são estaduais, também públicas. Em todas as avaliações nacionais e internacionais, as universidades públicas estão posicionadas nos primeiros lugares. E fazem isso ampliando cada vez mais as políticas de inclusão da população.

Andando pelo Brasil, vemos como o nosso país é desigual e o quanto ainda vai precisar de políticas afirmativas, existentes principalmente nas instituições públicas federais que, mesmo passando por dificuldades de todos os tipos, mantêm o seu compromisso com o desenvolvimento social e econômico do país.

As políticas inclusivas, ao mesmo tempo em que são catalisadoras de mudanças sociais profundas, trazem inúmeros desafios para a permanência dos estudantes na educação superior, o que demanda ampliação de recursos, pessoal especializado e formação da comunidade para garantir a trajetória de sucesso do estudante.

Como entoou o público de estudantes, gestoras e gestores, profissionais da educação e parlamentares durante a cerimônia de sanção da nova lei: “As cotas! As cotas! As cotas abrem portas!” E como atestou o presidente Lula, “basta um passeio pelo campus da UnB” para constatar o quanto a Lei de Cotas “mudou a cara do ensino superior neste país”. E vamos continuar mudando!

*Márcia Abrahão, Geóloga, reitora da Universidade de Brasília (UnB) e presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).

Artigo originalmente publicado no Correio Braziliense, em 20 de novembro de 2023.

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